Começou a funcionar nesta segunda-feira, 8, o Laboratório de Imunogenética (LIG) da Universidade Estadual de Maringá (UEM), criado para fazer testes de histocompatibilidade para transplantes de órgãos sólidos de doadores falecidos.
Até então, os exames de Painel de Reatividade de Anticorpos (PRA) e Prova Cruzada (CrossMatch), fundamentais para transplante de órgãos de doadores falecidos, eram realizados somente no Laboratório de Imunogenética do Hospital Universitário Cajuru, da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC), em Curitiba, e no Laboratório de Histocompatibilidade, do Hospital Universitário Regional de Londrina, da Universidade Estadual de Londrina (UEL).
A professora Larissa Bahls, responsável técnica do LIG, enfatiza a importância da redução do tempo de espera, destacando que a estimativa é de um doador falecido por dia, totalizando cerca de 30 exames por mês. “Além de ser caro, por ter que manter um motorista na estrada todos os dias para levar as amostras para Londrina, o processo fica mais demorado. Hoje, segundo Vivianne Toniol, enfermeira coordenadora do Serviço de Doação e Transplantes do Hospital Bom Samaritano, a média de espera entre retirar o rim de um doador e transplantar em alguém aqui de Maringá é de cerca de 20 horas. O que não é o ideal, pois quanto menor o tempo, melhor. Trazendo os exames para cá, acreditamos que podemos reduzir esse tempo de espera”, detalha.
O reitor da UEM, Leandro Vanalli, expressa a importância social da mudança. “Com o funcionamento desse novo serviço no laboratório, a UEM passa também a dar a sua contribuição para o sucesso e os bons resultados dessa rede tão importante e delicada, auxiliando com a estrutura física e facilitando a logística, visto que estamos numa região estratégica que pode contribuir muito com a infraestrutura que o Estado já possui. Além disso, é muito importante para trazer tranquilidade às famílias e esperança de vida renovada para o receptor que precisa tanto receber um transplante.”
Hoje, está sendo implantado o projeto de transição dos exames de Londrina para Maringá. Inicialmente, será feita a tipagem de antígenos leucocitários humanos (HLA) de doadores falecidos de órgãos, como rim, fígado, coração, entre outros. No segundo semestre, serão introduzidos os exames de monitoramento dos pacientes na lista de espera para transplantes renais e cardíacos, e, na sequência, os exames da prova cruzada, que é cruzar as células do doador com o sangue dessas pessoas que estão na lista de espera para saber quem pode receber.
Segundo Bahls, o novo atendimento irá se somar aos exames já realizados no LIG, que são de tipagem HLA de receptores e doadores de medula óssea, nas diferentes etapas do processo de busca por doadores compatíveis (família e Cadastrado no Registro Nacional de Doadores Voluntários de Medula Óssea – Redome).
Atualmente, o Laboratório realiza exames para o cadastramento de doadores voluntários de medula óssea dos Hemocentros de Maringá, Cianorte, Paranavaí, bem como exames de pacientes do Hospital do Câncer de Maringá e seus familiares. A partir do atendimento para transplante de órgãos passará a atender 23 hospitais, distribuídos nas cidades de Campo Mourão, Cianorte, Colorado, Goioerê, Maringá, Paranavaí, Sarandi e Umuarama. As amostras são encaminhadas pela Central Estadual de Transplante (CET-PR), por meio da Organização de Procura de Órgãos (OPO – Maringá).
Investimentos continuam
Para a abertura do serviço, o LIG teve que se preparar estruturalmente com a compra de equipamento e kits para exames. Até o momento, já foram investidos cerca de R$ 700 mil, e está em andamento mais um pedido de compras de cerca de R$ 500 mil em kits para tipagem HLA e para detecção de anticorpos anti-HLA. “É preciso destacar que, além do investimento financeiro, investimos horas e horas de treinamento e desenvolvimento técnico e de gestão da qualidade voltada para laboratórios, que executam estes exames de alta complexidade. O investimento veio dos recursos obtidos com a prestação de serviços que o LIG faz há anos junto ao Redome”, explica Bahls.
As vantagens do novo serviço são destacadas, incluindo benefícios para pacientes transplantados, familiares de doadores falecidos, equipes transplantadoras e a equipe da Organização de Procura de Órgãos (OPO) de Maringá. “Quanto mais rápido é o processo, menor a chance de rejeição e melhor o desfecho pós-transplante; o corpo do doador falecido será liberado mais rápido para os familiares, as equipes transplantadoras vão trabalhar com mais segurança devido à maior facilidade de comunicação com a equipe técnica do laboratório, além de vislumbrar melhor evolução de seus pacientes por trabalhar com menor tempo de isquemia fria (tempo entre a captação do órgão e o transplante propriamente dito)”, frisa a coordenadora do LIG-UEM.
A coordenadora da OPO-Maringá, Gislaine Duarte, avalia positivamente o início da prestação do serviço na UEM. “Tudo que envolve logística de transporte de amostras acaba ficando um pouco mais complexo. Vemos com muito bons olhos a retomada pela cidade de Maringá da realização desses exames, pois, desde 2021, passamos a encaminhar os exames da nossa região para Londrina, após um laboratório privado deixar de prestar o serviço. Mas sabíamos que o laboratório de UEM tinha interesse em assumir esta demanda, só era preciso adequação, como aquisição de materiais e insumos e treinamento da equipe. Avalio que não há necessidade de ter laboratório nos 399 municípios paranaenses, mas, ao menos, ter laboratório na cidade onde acontece o transplante, ajuda muito, favorece a logística, tornando mais dinâmico tanto para o usuário quanto para os profissionais que atuam no processo.”
O Laboratório de Ensino e Pesquisa em Análises Clínicas (Lepac), da UEM, também irá absorver os exames de Covid dos pacientes que estão na fila de Maringá e região. De acordo com Duarte, somente os exames sorológicos ainda vão continuar sendo feitos em Londrina, não permitindo neste momento a redução do custo de logística, mas esforços estão sendo feitos para a migração dos exames sorológicos para Maringá.
Duarte enfatiza a importância dos exames imunogenéticos serem realizados nas instituições de ensino superior. “É importante que os testes de imunogenética sejam mantidos nas universidades porque o profissional que faz esse exame deve ter expertise no assunto, notório saber nessa área tão específica. Nós imaginamos que esses acadêmicos vão perpetuar este conhecimento. É muito rico para o cunho acadêmico. A equipe do Laboratório de Imunogenética da UEM foram muito proativos nesse processo, nos apoiaram e se mobilizaram bastante para que essa prática fosse absorvida pela universidade, não simplesmente pela relevância acadêmica, mas pela relevância social do serviço.”
Os estudantes da UEM passarão a ter oportunidade de conhecer um serviço de ponta, equipamentos e técnicas avançadas.
Doadores falecidos
Uma vez identificada a morte encefálica de um potencial doador, o ideal é que imediatamente seja aberto protocolo para diagnóstico de morte encefálica e, na sequência, seja coletado e enviado o material ao laboratório de referência para os exames pré-transplante necessários. A demora neste processo pode acarretar, inicialmente, a desistência da doação por parte da família do doador, além de ter consequências também para o receptor, uma vez que podem aumentar as chances de rejeição e perda do órgão transplantado. Ainda, o transporte da amostra para realização dos exames em outro município, além de representar um alto custo (motorista, combustível, manutenção do veículo), também compromete a viabilidade da amostra, aumentando a chance de problemas técnicos, uma vez que os exames só serão realizados quando a amostra chegar ao laboratório de análise.
Além do benefício financeiro a longo prazo e agilidade no transplante, uma vez implantada a metodologia para exames PRA, há a possibilidade de realizar testes para acompanhamento dos pacientes no pós-transplante, identificando precocemente o início de processos de rejeição. Isto evitaria a necessidade de medicamentos de alto custo, procedimentos de biópsia e até mesmo a perda do órgão e volta do paciente para lista de espera.
A equipe do LIG é composta de cinco professores, envolvidos com a prestação de serviços, uma técnica de nível superior, três técnicos de nível médio e uma agente administrativa. Segundo Bahls, no momento, está sendo buscado maneiras de ampliar a equipe para conseguir cobrir o plantão de sobreaviso 24h/dia nos 365 dias do ano, conforme exigência da CET-PR. “Com a equipe que temos hoje conseguimos montar a escala de plantão, porém precisamos de pessoal para cobrir férias, licenças e, principalmente, para os períodos de recesso da UEM”, alerta.
Autorização eletrônica de doação de órgãos
Os cartórios de todo o País lançaram na semana passada um documento eletrônico que permite a oficialização da vontade dos cidadãos que querem ser doadores de órgãos. A partir de agora, quem desejar se tornar doador de órgãos poderá preencher a Autorização Eletrônica de Doação de Órgãos (Aedo) em qualquer um dos 8,3 mil cartórios de notas do país. A emissão é gratuita e o preenchimento do documento on-line.
As autorizações ficarão disponíveis em um sistema eletrônico e poderão ser acessadas pelos profissionais de saúde para comprovar o desejo de quem faleceu. O cidadão poderá autorizar a doação dos seguintes órgãos: coração, pulmão, rins, intestino, fígado, pâncreas, medula, pele e músculo esquelético.
Iniciativa vai favorecer a doação de órgãos no Brasil. As doações de órgãos possibilitaram 9,2 mil transplantes no País, em 2023. O número representa aumento de 13% em relação ao ano de 2022.
O Paraná manteve a liderança nacional em doações de órgãos em 2023, registrando 42,5 doadores por milhão de população (pmp). Em números absolutos são 486 doadores efetivos. Os dados são do Registro Brasileiro de Transplantes (RBT), elaborado e divulgado pela Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO) nesta semana. A média do Brasil foi 19,9 pmp.
As doações de órgãos ocorrem somente após o diagnóstico da morte encefálica e precisam ser autorizadas pela família do doador, mesmo que o paciente tenha registrado em vida a vontade de ser doador. Todas as famílias dos potenciais doadores passam por uma conversa com as equipes de saúde para esclarecer dúvidas e receberem orientações quanto à possibilidade da doação de órgãos.
O RBT apontou que o Paraná possui a menor taxa de recusa familiar para doação do Brasil. O Estado registrou 27% de recusa durante as entrevistas familiares, enquanto a média nacional foi de 42% no ano.
A Central Estadual de Transplantes (CET) fica em Curitiba e é responsável pela coordenação das atividades de doação e transplantes em todo Estado. Além disso, conta com quatro Organizações de Procura de Órgãos (OPOs), na Capital, Londrina, Maringá e Cascavel. Estas unidades trabalham na orientação e capacitação das equipes distribuídas em 67 hospitais do Paraná, que mantêm Comissões Intra-Hospitalares de Doação de Órgãos e Tecidos para Transplantes (CIHDOTT).